Há quase um ano eu vinha tentando uma reserva no restaurante Au Pied de Cochon, um dos mais celebrados de Montréal, mas sempre alguma coisa dava errado na última hora. O que fazia a minha expectativa em relação ao local crescer no mesmo ritmo em que crescia a reputação do chef Martin Picard. Até que finalmente todas as estrelas se alinharam e conseguimos uma mesa para seis em janeiro, quando os três casais de amigos tinham algo para comemorar: o aniversário do Mohammed, marido da
Fabrícia, aniversário da Nadja, esposa do Chris, e meu aniversário de casamento com o Luiz.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiLtwQBCo9GZQDndWm3XernwbxogldWU8hZTMyc0LVgWyOO4mao5l6axWFskBxsQmeucWtPi6xd_5r5CCRJDqtDVKhN-IPt7RHbzXPIbclVT_MFilB9QXDEjOFgUif5FVhct9f563qXZCY/s400/3241635739_f6c60ed3f4_b.jpg)
Então fomos, em pleno janeiro congelante, para o lugar mais caloroso do hemisfério norte - sim, porque o Au Pied de Cochon é um lugar onde as pessoas se divertem, falam alto, bebem e conversam despreocupadamente até altas horas. Nada de clima romântico ou mesas com toalhas de linho branco. Nada também mais condizente com a persona do chef Martin Picard, conhecido por suas loucuras experimentais na cozinha, por seu amor pelo foie gras e carnes de caça, e por não ligar a mínima para o que diz o manual de como chefs premiados devem se comportar (ele se recusa a usar o avental branco, por exemplo).
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgPnGyJ8xqpHuTsSmy7-1l-rik2YyP0XPtvwxcaW9b3HARhKDOspp8gjdHcYjwa1uMxi5T2O6z0EopEZNr0Or7Fa5BQgeyqoxR5HFKuJ0HXCf6rXKLYsYmq8s5Hbhf46R5yfxrrCTYExCE/s400/3241437137_308bd9d397_b.jpg)
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjg3quo8fy3zqKewLNGsH2NfH7dSDw152Ncg8GTsxm_cimqoZ4HPBsW_MQHfgT0okxrLfDwOKklKoPBIvDGRaPMiMCDuQzkkfAT5BmFr_hNDPamHfk5Up-eTbWSWCsSSsOOskLYmv0xyg8/s400/3242274768_6802c79f39_b.jpg)
Para quem nunca ouviu falar, o Au Pied de Cochon (que em francês significa "no pé do porco") é conhecido por oferecer um vasto menu contendo foie gras - dizem até que o restaurante é o maior consumidor do produto no mundo, o que irrita muitos ambientalistas. Mas aqui o foie gras não é servido do jeito que você está acostumado a ver nos restaurantes franceses, e sim incorporado a pratos populares como cachorro-quente, hamburguer e até a poutine, que é o prato típico
quebecois feito de batatas-fritas e queijo fresco cobertos com gravy.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgO87rxa39jyufgVRtG_xXL67o0dd4mzu-00-eKAga87_6fTGf0PDV2gATw9a5yqoxorgDiELvmXOG6595OjnZ_j_Lf98Ln2gaWzT-4-6AgxvDVA2ZyMwfIoWLObm6sqPXKS-bbTCNaiq0/s400/3241506763_aa1d7eb450_b.jpg)
A popular poutine, cuja combinação calórica promete aquecer do frio e curar qualquer ressaca, recebe uma dose generosa de foie gras. Essa mistura de requinte e ironia é a marca registrada do chef Martin Picard.
O menu é uma verdadeira celebração das carnes de caça típicas do Canadá, como pato, bisão, cervo e, claro, porco, todas as partes dele. O pé do porco que dá nome ao restaurante é servido recheado com foie gras. Os pratos são pesados, gordurosos e extravagantes, é verdade, mas o chef não pede desculpas nem faz concessões. Afinal, este não é um restaurante comum, mas sim um lugar onde se vai para, bem, chutar o pau da barraca. Mas isso não quer dizer que não haja requinte, por exemplo, na apresentação dos pratos ou na combinação inusitada de ingredientes.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh5Y0FdGkisUaOlsZ7lWl8kiJ0GuqOXbxMtCU1HmjbmvfLzixxGs4oDnZC8PjiEsNt733ro3NoIIqh6zc9s5xZkYHRwNykix1FBfsF3G1WWTcbMcgaEoR-FVaP6dohAZJfpJ3zbroBxskc/s400/3241454547_21bc4613ab_b.jpg)
A Fabrícia pediu um carpaccio de pato servido delicadamente num prato com azeite, cebolinhas e uma gema de ovo.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhStxPMo1iIHNZI-E_Q3YsrRhkJqwnjmaj_KHOlZ_IILwaiWQAWP-93nCQHRMFCBaKcLJJdnRn15PI1Wuc59xALjA-u_Wr9DmpmtC0jhUNFFSd1ygY8i1E-Y2Xl3tgVMAZ6jpLPpWunhb4/s400/3241520631_4cb62419c8_b.jpg)
A costeleta de porco feliz (este é o nome do prato) vem com um molho de cebolas caramelizadas, bacon e outras delícias.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh8JYa_-RcXqqDxizOlwP3f6vSTSSlPDEoauDPe4DoBFugzBkcaZ8lyQYhaQxHBxCleJEnrkYr9e2yP8YMVhzT6hcLICmfVXFwTxlCHQcZj4U6r_nD1Js2Qw3xNGc1ZRI6zTL_fINtd69k/s400/3242347586_d188219257_b.jpg)
O Champvallon é uma caçarola de cervo, bisão e outras carnes cobertas com fatias finíssimas de batatas e servidas numa panela de barro.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh_FujKj0vGDcvYNaTcrG2bTuh1QqbYGWB-1l9Y7XTEGasSbEepEswRljjZZOPeb_YAWu9z_rDmn29r9RXxLQLtydqirosqyB89tiOdDPB9c-vBXsFIY8l3nTZ_kl0GTNYwq0YwgQCeRg4/s400/3241612439_1acbacdd29_b.jpg)
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhAh07djgRjLVJLjCe3tMQYJSzpitkGjHWsE5D13884nLY2NQkvLKe9ApVwwDpjKTFtlqD1VQ97leWxaMSeRvCYO4GYpp33mAmGbVJKA_w8ANqURGi7B-YbBBFHfMEAfrGDrBwXMsMcl8k/s400/3242284514_c085b0d5b2_b.jpg)
Os churros e bolinhos de bachalhau (sobremesa e entrada, respectivamente) são servidos no melhor estilo botequim, em cones de papel com o logotipo do restaurante.
Um dos pratos mais divertidos é, sem dúvida, o
canard em conserve, ou pato na lata. Meio peito de pato, 100g de foie gras, repolho e outros ingredientes são enlatados e cozidos na lata.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhbg1SvQx9VXEIxP_5z8Q3BnvSO5jqUHKdpR7D82PLqYvZulKGort8x8V8qUWemVPMKUle443tBLtPnxiH-y1wy0YhBsf8TheHQixNnmL-q8hpx1QXHia4lGxI5L63MbS-Z5X1fy2Ypebo/s400/3241565519_0f58a0c103_b.jpg)
Vinte minutos depois o garçom vem com um prato contendo uma torrada e purê de nabo.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjPehyAYjM2re95YhbDojnlI66eki0aSrEonpTWCjIcvdciKevQjEE5x5DMOtNVBuWtuXtdZbZBdqhYvOJvYI7XTj7R5HAdSVkyD8aM1Yc13hvzLCpXskfrRfMZQkoD8iLxUTMzLiBR9TM/s400/3241570971_02b1274707_b.jpg)
Ele então abre a lata na sua frente e...
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEglwNfY512_ioQrw5_LANTpDUcNLB2RmTWu3BkwoCTEfiHkcT1jv9vatZm5eD5pTi62JbQX7N2tC-hacihU9jtcxf3g1Q8h5mi2po0QedAY7WdXZq2amS27ixZbLyH0YzD80uST3j77lmo/s400/3242408836_e75af22a11_b.jpg)
Despeja o precioso conteúdo sobre o purê e a torrada.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgAhZITdqjOUouB7l2iaedJ7vf6uyGN68bmG7V-5O-RMA09u1txBYFfo5vYgxKRLy4vVJhTplASbuH8m1tOrAjMK91dhm6X8z5R_JTeOIyP94or_kRRKW3tCElWqahm0DFj30w3g1yK6eY/s400/3242411100_e51d5263b9_b.jpg)
Pato na lata! Uma interpretação deliciosa, audaciosa e criativa da "comida enlatada".
Mas o melhor da noite ainda estava por vir. Quando estávamos no meio do jantar Martin Picard em pessoa aparece no restaurante e começa a ir de mesa em mesa cumprimentando as pessoas. Eu não esperava vê-lo por lá, sabendo que ele é muito ocupado e viaja constantemente, mas a Fá teve um pressentimento e foi preparada, levando consigo uma garrafa da cachaça especialíssima feita artesanalmente por seu pai.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEibg4-XznTz819VZZEUK956OVrI8pyUK5PnvgY6H5xRfjdV2bopwMZxrvSmG91i-UPRQrmRK1mf9PEIlSr43K_-V5F45WLTdOGXQn8HROq5eg7xsNwCi9nCsnXGJ39uQlUrCJOl5obit0o/s400/3241593495_ea214a9f53_b.jpg)
Que melhor jeito para atrair um chef conhecido por ser bon-vivant? Em pouco tempo Martin estava na nossa mesa tomando cachaça e conversando animadamente. Quando ele soube que estávamos comemorando tantas coisas, mandou vir doses de rum e vodka e bebeu conosco.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhkqc3iU4RDbWaGUvnWZbFO455EloMxc9gSJ33hR4tlLz6Sy8aIHcJctp2sRO97lJfGtWa7DhSqZM1Q2YL3RzB99yLrkW4erMWpWRzqfzJG8TfXNrkvNZGNVJdC2jv8r-nfj1M8ofUlkvI/s400/3241599569_b6087280b4_b.jpg)
Se não fossem as calorias e carboidratos ingeridos durante o jantar, acho que não teríamos conseguido voltar para casa!!
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg4_GLdKarKOB27mrkf4XsG4oJeU9YDe0oA_VvjLAVB9E5k1GRrbXkbh9P4Eo37CWDzKZBHjQSbJPjHIJRx7L-zXNoNgyWDNT78RYa2VDAHExqwC_Y6e0ORXAwyj6GEUo4FkxfWJDnkwZQ/s400/3242442928_9b1bd0da31_b.jpg)
Eu não sou uma carnívora aventureira como Martin (não sei se comeria o pé do porco ou um dos pratos com miúdos, por exemplo), nem me sinto confortável comendo foie gras com frequência, mas não há como não admirar a paixão e o envolvimento que existem em seu restaurante. Este é um chef que respeita os animais que serve (sua última "mania" é caçar pessoalmente ou pelo menos supervisionar o mais próximo possível as carnes servidas no restaurante), que não acredita em meio-termo quando se trata de qualidade e que, sobretudo, ama a vida, coisa que se torna palpável em seu restaurante.
Crédito das fotos: Fabrícia Rocha e Luiz Teles.
Mais sobre Martin Picard:
Site do Au Pied de CochonReceita da poutine com foie grasVeja Anthony Bourdain no Au Pied de Cochon