terça-feira, 24 de julho de 2012

A vida íntima das papinhas (parte 4)

Ou "o que aprendi com Dr. Carlos González"

As mamães mais antenadas devem conhecer o Dr. Carlos González, pediatra espanhol, autor de alguns livros sobre cuidados na primeira infância e fundador do centro de aleitamento materno lá na Cataluña. Ele é bastante conhecido por ir contra a corrente da modernidade (tanto que o subtítulo de um de seus livros mais conhecidos, "Besame Mucho", diz assim: "um livro que ensina a cuidar dos filhos como antes") quando o assunto é criar filhos - ou seja, em linhas gerais, ele defende a amamentação em livre demanda e prolongada, dar muito colo e carinho, dormir na mesma cama com os bebês, ter disponibilidade emocional e de tempo para a educação - e, por isso mesmo, é um tanto polêmico. Há quem defenda e goste muito e há quem discorde.

Eu particularmente gostei muito de tudo o que li, especialmente o livro "Mi niño no me come" (ainda não foi traduzido para o português, mas há uma comunidade no Facebook que traduz trechos), em que ele trata justamente da introdução de alimentos complementares e de eventuais problemas que ocorrem nessa fase pré-desmame. Sem querer fazer um resumo do livro, vou comentar apenas algumas coisas que me chamaram a atenção.

A primeira delas é que o Dr. González atribui todos os chamados "problemas" de alimentação a um desequilibrio entre a realidade do bebê (seu apetite, vontade, paciência, paladar) e a expectativa da mãe. Sim, porque toda mãe que diz que a criança "não come nada" está exagerando, caso contrário o rebento morreria de fome, não é? O fato é que as crianças comem mesmo (e devem comer) menos do que esperamos, especialmente na fase entre um e dois anos, quando começam a crescer menos rapidamente do que no primeiro ano de vida.

O que me leva ao segundo ponto, que para mim é fundamental, que é o respeito ao bebê (e posteriomente à criança). "Confie no seu filho, ele sabe do que precisa", diz o pediatra. Ele sabe muito bem mostrar se está ou não com fome, se gostou ou não do almoço. Afinal, todo bebê aprende muito rápido a fechar a boca e virar o rosto, mesmo quando coloca qualquer porcaria na boca. Cabe a nós ter paciência para ouvir e respeitar. Nós não ficaríamos muito chateados se alguém (a quem amamos muito) de repente teimasse em nos forçar a comer o que não queremos quando não estamos com fome?

Ele então propõe um exercício para as mães que acreditam que seus filhos não comem (mas que serve para todas): nada de forçar a comida, enganar, dar de comer na frente da televisão, usar comida como moeda de troca (castigo ou recompensa), comparar, subornar, usar estimulantes de apetite (que, pasmem, alguns pediatras até recomendam). Dr. González defende o que os americanos chamam de "baby-led weaning", algo como "desmame à cargo do bebê", ou seja, que o próprio bebê escolha o que, quando e quanto comer.

É preciso saber que essa filosofia, para um bebê que ainda não sabe sequer levar comida à boca, vai significar muita bagunça, comida espalhada por todo lado, alguns (vários) momentos de frustração quando ele não quiser comer nada e dúvida, muita dúvida. Mas também há momentos enriquecedores quando você vê que seu filho começa a participar da mesa e curtir de verdade as refeições em família. Nós vivemos para comer, e não o contrário.


Aos dez meses, Marcel adora segurar a comida com as próprias mãos - seja pedaços de pão, banana, macarrão, grãos de feijão ou floretes de brócolis - e levar sozinho à boca (às vezes com ajuda da mamãe, sempre de colher em punho)

quarta-feira, 4 de julho de 2012

A vida íntima das papinhas (parte 3)

Finalmente uma receita! Afinal, este blog é sobre comida e não sobre questões da maternidade, embora elas venham automaticamente na bagagem de quem se propõe a cozinhar para os bebês. A verdade é que, embora tenha me preparado, lido e separado muitas receitas e tabelas nutricionais, não tenho seguido nenhuma na hora de fazer as papinhas de Marcel. Mais um mito desconstruído, o de que conseguiria seguir e até elaborar receitinhas.

Em parte por falta de tempo e organização, em parte por ele ter um paladar um tanto seletivo, o fato é que tenho feito as comidas de maneira bem instintiva, usando a imaginação e o que tem na geladeira. Depois é só ver o que agrada e seguir daí, sem neura. Confesso que nunca segui à risca o manual da nutricionista, procuro apenas me certificar de que o prato dele esteja bem colorido e saboroso. Isso tem mudado minha relação com a cozinha de modo geral, tenho encarado as coisas com mais leveza e menos disciplina. Mais um aprendizado da maternidade...

Mas vamos voltar ao assunto? Das frutas, como já disse, nada supera a inimiga número 1 da mamãe aqui, a banana (já estou quase superando meu trauma de tanto que amassei banana nos últimos meses). Dos legumes, nenhum faz mais sucesso que o brócolis! Coisa que descobri por acaso, ao servir um creme de brócolis que havia feito para os adultos da casa, e da qual desde então tenho tirado muito proveito. Uso os talos e folhas para fazer um panelão de sopa verde para a janta, e as floretes são cozidas no vapor diariamente para o almoço. Nada de desperdício, ainda mais com o brócolis custando o olho da cara!



Papinha verde para um pequeno devorador de brócolis

- Uma cebola pequena e dois dentes de alho
- Talos e folhas de um brócolis médio
- Uma cenoura média (ou um pedaço de abóbora)
- Uma batata grande ou mandioquinha
- Uma folha de couve manteiga (opcional)
- Uma abobrinha pequena
- Salsinha e cebolinha a gosto
- Água ou caldo de frango ou legumes

Na verdade, não se trata de uma receita propriamente dita, já que os ingredientes podem ser trocados e/ou aumentados conforme o gosto (menos o brócolis, que deve ser o sabor predominante). O que muda aqui é apenas a técnica. No início eu refogava toda a comida do meu bebê em água, mas desde que ele fez nove meses recebeu um upgrade para o azeite, porque eu acreditei que o paladar dele estava pronto. Vai depender muito da criança.

Corte os temperos e refogue a cebola, alho, salsinha e cebolinha num fio de azeite. Corte os legumes em pedaços pequenos e junte aos temperos. Cubra com água ou caldo de galinha caseiro e deixe cozinhar bastante, uns quarenta minutos, ou até os legumes mais duros cozinharem por completo. Bata no liquidificador ou com mixer e acrescente uma pitada de sal e pimenta do reino, se quiser.

Rende um panelão, que eu como também (conserto o sal no meu prato) e congelo o que sobrou. Eu sirvo esta sopa desta maneira no jantar, mas se tiver que servir no almoço ou quiser dar uma encorpada acrescento uma colher de arroz integral ou macarrão cozido (depois de batida), e se quiser ainda mais proteína, junto um pouco de frango desfiado ou uma gema de ovo de quintal cozida.